Olá, leitores,
Na semana passada, a Fed reduziu as taxas para o intervalo objetivo de 3,50 %–3,75 %. Esta decisão já estava plenamente refletida nos mercados e foi, em geral, pouco surpreendente.
O que realmente surpreendeu os mercados foi o anúncio da Fed de compras mensais de Treasury bills no valor de 40 B USD, rapidamente apelidadas por alguns de “QE-lite”.
No relatório de hoje, analisamos o que esta medida de política altera, o que não altera e por que consideramos esta distinção relevante para os ativos de risco. Apresentamos também uma atualização sobre os principais indicadores onchain de BTC e o que estes revelam no contexto atual.
Vamos a isso.
A Fed reduziu as taxas, como previsto. Esta é a terceira descida este ano e a sexta desde setembro de 2024. No total, as taxas foram reduzidas em 175 pontos base, levando a Fed Fund Rate ao nível mais baixo dos últimos três anos.

Fonte: FRED
Além de cortar as taxas, Powell anunciou que a Fed irá iniciar as “Reserve Management Purchases” de T-Bills, à razão de 40 B USD/mês, a partir de dezembro.
Dadas as tensões contínuas no mercado de repo e na liquidez bancária, já antecipávamos esta medida.
O consenso (no X e ainda mais na CNBC) é que se trata de uma mudança “dovish” na política.

via X
O debate sobre se o anúncio da Fed equivale a “impressão de dinheiro”, “QE” ou “QE-lite” surgiu de imediato nas timelines.

via X
Naturalmente, somos “participantes de mercado”. Mas procuramos sempre analisar os acontecimentos como “observadores de mercado”.
A psicologia do mercado continua orientada para o risco. Neste contexto, esperamos que os investidores sobrevalorizem narrativas otimistas associadas a manchetes de política e subvalorizem o verdadeiro mecanismo de transmissão da política para as condições financeiras.
Consideramos que a nova política da Fed é positiva para a “infraestrutura dos mercados financeiros”, mas não para os ativos de risco.
Onde divergimos? Pensamos que o mercado está a confundir a expansão do balanço com a flexibilização das condições financeiras ou “QE”.
A nossa perspetiva:
Portanto, não. Isto não é QE. Não é repressão financeira. E, para ser claro, o acrónimo não importa. Pode chamar-lhe impressão de dinheiro, se quiser. Mas não suprime intencionalmente as yields de longo prazo através da remoção de duration, o que normalmente força os investidores a assumir mais risco.
Isto não está a acontecer neste momento. A evolução dos preços do BTC e do Nasdaq desde quarta-feira passada confirma-o.
Acreditamos que o BTC (e os ativos de risco em geral) terão o seu momento de destaque, mas isso só acontecerá após o QE (ou seja qual for o nome que a Fed dê à próxima fase de repressão financeira).
Esse momento chegará quando:
É nesse momento que os investidores identificam a repressão financeira e reequilibram os portfólios em resposta.
Ainda não estamos nesse ambiente. Mas acreditamos que está a caminho. O timing é sempre complexo, mas a nossa previsão base é que a volatilidade aumentará significativamente no primeiro trimestre do próximo ano.
Este é o cenário “de curto prazo”, na nossa opinião.
O problema central não é a política da Fed no curto prazo, mas sim a guerra comercial global (guerra cambial) e a tensão criada no núcleo do sistema do dólar.
Porquê?
Os EUA estão a avançar para a próxima fase da sua estratégia: relocalizar a produção, reequilibrar o comércio global e competir em setores estratégicos como a IA.
Esse objetivo entra em conflito direto com o papel do dólar enquanto moeda de reserva mundial.
O estatuto de moeda de reserva só funciona se os EUA mantiverem défices comerciais persistentes. No sistema atual, os dólares são enviados para o exterior em troca de bens e depois reciclados para os mercados de capitais dos EUA através de Treasuries e ativos de risco. Esta é a essência do Dilema de Triffin.
Este gráfico:

Fonte: FRED
É o reflexo deste gráfico:

Fonte: U.S. Bureau of Economic Analysis
Desde 01/01/2000: Mais de 14 T USD de valorização em ações (sem incluir 9 T USD de atuais posições estrangeiras em obrigações). Quase 16 T USD saíram para pagar bens.
Os esforços para reduzir o défice comercial reduzem necessariamente o fluxo de capital reciclado para os mercados dos EUA. Embora Trump destaque compromissos de países como o Japão para “550 B USD de investimento na indústria dos EUA”, omite que o capital do Japão (e de outros) não pode estar simultaneamente na indústria e nos mercados de capitais dos EUA. Consideramos que esta tensão não terá uma resolução simples. Pelo contrário, prevemos maior volatilidade, reprecificação de ativos e, eventualmente, ajustamentos cambiais (queda do dólar e do valor real das Treasuries dos EUA).
Na nossa opinião, este período de transição exigirá uma “grande desvalorização” do dólar.
O timing e a execução são incertos, mas a direção não. Quanto mais agressivamente os EUA prosseguirem a relocalização e o reequilíbrio comercial, maior será a pressão sobre o dólar, as taxas reais e os preços dos ativos para ajustarem.
Em resumo: A China está a suprimir artificialmente o Yuan, tornando as exportações artificialmente baratas. Por sua vez, o dólar está artificialmente valorizado devido ao investimento estrangeiro, tornando as importações artificialmente baratas.
Acreditamos que uma desvalorização forçada do dólar está iminente para resolver este problema. Na nossa opinião, é a única forma de corrigir os desequilíbrios comerciais globais.
O mercado decidirá, em última instância, que ativos e mercados são dignos de “preservar valor” neste novo regime de repressão financeira.
A grande questão é se as Treasuries dos EUA continuarão a servir como ativo de reserva global quando tudo isto terminar.
Acreditamos que o BTC e outros ativos globais não soberanos, como o ouro, terão um papel muito mais relevante. Porquê? São escassos e não dependem da credibilidade da política.
Este é o cenário “de longo prazo”, na nossa perspetiva.
O que nos dizem os dados onchain sobre o contexto atual?





